Aos 82 anos, um senhor poeta destacou-se entre os 33 idosos que vivem num asilo público.
Eu e um grupo de doadores voluntários fomos entregar as doações e ao passarmos por sua cama, onde estava deitado, assistindo à TV, sua simpatia deu vontade de ficarmos mais um pouco.
– Olá! Como vai o sr.?, perguntamos formalmente
– Eu vou bem, disse ajeitando o lençol
A diretora do asilo deu uma informação relevante:
– O sr. Carlos é poeta
Eu: – Poeta! Que maravilha!
Ele:- Sim, eu gostava de escrever. Agora, já não consigo mais…
Eu: – Ah, mas ainda pode recitar, não é? Lembra de alguma bem bonita para recitar para a gente?
Ele: – Sim, eu lembro de todas. Mas tem uma da qual gosto mais. Posso começar?
Eu pedi um tempinho para ligar o gravador e ele foi declamando, declamando, sem esquecer uma única palavra.
Quando terminou, aplaudimos e ele chorou dizendo que era a história dele com seu grande amor…
Saímos com olhos marejados e mais um aprendizado na bagagem do voluntariado. A certeza da máxima de Francisco de que é dando que se recebe. Fomos ao asilo doar fraldas geriátricas, mas recebemos a lição de que só o amor permanece.
Aos 82 anos, seu Carlos afirma que nunca esqueceu a sua Angelita.
ABAIXO A TRANSCRIÇÃO DE SUA POESIA
Certa noite amargurado
Sem ninguém pra conversar
Só, fui beber num bar
Pra poder desabafar
E a jovem que passava me viu chorar
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Ela entrou e perguntou
Se eu sentia alguma dor
Eu disse que sim,
Mas que para ela não tinha doutor
Porque ela vem da alma
É a dor por não ter um amor
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Então, somos dois, pois sinto a mesma nostalgia
E chego a me perguntar
Será que você podia
Deixar eu beber contigo
Pra ver se volta a alegria?
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Eu deixei e nós ficamos Conversando sem parar
Tão ligados que nem vimos
o tempo por nós passar
Quando a dona veio e disse que o bar ia fechar
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Já era tarde
Saímos sem saber que bar ir
Ela disse estar com sono e queria dormir
Eu disse: vamos pro meu quarto que é bem pertinho daqui
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Assim que entramos no quarto,
Ela calada ficou
Eu perguntei o que era
Foi então que ela falou
Que fazia mais de ano que ela não fazia amor
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Fique tranquila que eu não sou um tarado assim
Se você não está querendo,
Eu também não estou a fim
Porém, se você quiser, terá tudo de mim
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Ela disse: Pois é isso que eu queria te falar
Porque desde que te olhei senti desejo de amar
E é o que mais quero agora, se acaso você topar
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Nessa, eu beijei sua boca e tirei minha camisa
Ela tirou toda a roupa e colocou sobre a mesa
Eu fiquei admirado quando vi sua beleza
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E a partir daquele instante, eu vi nascer um grande amor
Ela me abraçou com força e eu senti o seu calor
E dos seus lábios carnudos suguei seu doce sabor
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E quanto mais eu queria, mais ela queria mais
Ela era uma brasa difícil de se apagar
E eu torcia para que a noite demorasse a terminar
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E como tudo bom tem fim, a noite foi terminando
Os raios dourados do sol, no horizonte despontando
E ela linda nos meus braços, como um anjo ressonando
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Quando ela despertou, me disse querer fumar
Eu disse: Garota, eu não fumo, porém eu posso comprar
Ela disse: Não demora, que é pra gente namorar
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Eu demorei e, ao voltar, ela não estava mais acordada
Tava linda ressonando, e o seu perfume exalava
Eu fui e beijei seu pescoço
Ela acordou excitada
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Dessa vez eu amei com a energia que eu tive
Ela me arranhava todo e se torcia todinha
Aí eu vi a mulher fogosa que nos meus braços eu tinha
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Aí, eu lhe perguntei se ela queria ser minha
Ela disse: Eu já sou sua desde a hora em que eu te olhei
Me simpatizei por ti
E ao te ver, te desejei
Tantos machos em volta minha,
e eu sempre relaxei
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Mas quando te vi sentado, triste, sozinho
Pensei comigo: Esse é outro, que chora sem ter carinho
Vou já me sentar com ele e conversar um pouquinho
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Porém, quando cheguei perto a minha alma estremeceu
Não sei o que se passou, mas senti mudar o meu eu
Porque um desejo novo no meu coração nasceu
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Eu disse: Menina linda, o destino é engraçado
Porque vivo tão sozinho e quero alguém do meu lado
E se tu quer casar comigo, nós já estamos casados
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O nome dela era Angelita
Era todinha aplicada: culta, jovem, bonita, do corpo bem torneado
Com um beijo tão gostoso que eu fiquei apaixonado
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Aí eu procurei outra casa pra morar
E um lugar mais bacana não foi difícil de achar
Aluguei uma perto da praia, que dava pra ver o mar
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Passamos a morar juntos, e para dizer a verdade
Tinha morrido a tristeza, era só felicidade
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Nós namorávamos de noite, de manhã e de tarde
E com essa vida boa, ela danou a engordar
Ficou com um bucho tão grande, a ponto de estourar
E ao completar nove meses, pariu dois pra complicar
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Nasceu um par de meninos,
Medalha de ouro em chorar
Quando um estava banhando,
O outro queria mamar
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Mas eram bem bonitinhos, dava gosto de se ver
Eu trabalhava dobrado para podê-los manter
Era uma alegria imensa que eu nunca mais vou viver
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Pensei que a felicidade fosse pra sempre durar
Porém uma enfermidade veio Angelita derrubar
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Estava muito doente
E tinha que se operar
O golpe foi de lascar
Difícil de suportar
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Vieram me comunicar
Que ela ia se internar
E eu para não chorar
Passei a me embriagar
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Ela foi para o hospital e só resistiu um mês
E eu fiquei muito mal, amargurado outra vez
O destino me fez tão feliz e tão infeliz me fez
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Os meninos entreguei aos tios para criar
Fiquei pior que um mendigo
Mas consegui levantar
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E quando eu lembro de Angelita
Dá vontade de chorar
Hoje, eu prossigo sozinho
Vivendo a recordação
Da minha menina linda
Que amei com toda a paixão
Angelita estará sempre viva no meu coração
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Morreu a minha Angelita
Que destino mais cruel
Que pôs mel na nossa boca
E depois veio foi fel
E o que será de mim
Só quem sabe é Deus do céu…